domingo, 23 de dezembro de 2012

Dia 23/12/2012 - Era para ser um dia de descanso em San Pedro de Atacama (The day after)

Claro que tendo ido dormir cedo, acordei mais cedo ainda, além do fato de termos ganhado mais uma hora devido ao fuso horário, pois o Chile tem uma defasagem de duas horas em relação ao Brasil. Eu queria fotografar as ruas de San Pedro ainda vazias, mas como a máquina fotográfica havia "estranhamente" dado memória cheia no dia anterior, precisava descarregar o cartão no netbook do André. Fica aqui uma dica, um netbook para mais de duas pessoas usarem em uma viagem não dá, pois acaba não dando tempo para todos acessarem. Como eu não havia usado até ali, achei que era um bom momento, pois todos ainda dormiam. Tentei ao máximo não fazer barulho e no meio da bagunça e pegar tanto a máquina fotográfica quanto o netbook, mas mesmo assim, acabei acordando o André. Coloquei o netbook na mesa do lado de fora e liguei tanto ele quanto a máquina fotográfica, porém para minha surpresa, haviam apenas 6 fotos nela!  
Isto era o que havia na memória da máquina, última foto do dia anterior
Me deu até embrulho no estômago, pois achei que o cartão tinha dado pau, então conectei a máquina ao computador e de fato era só o que havia. Abri a máquina com a ideia de plugar o cartão diretamente no computador, na esperança de encontrar algo, porém o que eu não encontrei foi o cartão de memória!  Não estava na máquina...  Aí me deu até dor de barriga, não podia ser, eu devia ter umas 600 fotos ou mais naquele cartão.  Comecei a fazer uma revisão mental dos eventos anteriores, mas foi difícil devido ao nervosismo. Até que me lembrei que tinha fotografado normalmente até antes de Socaire, quando parei para trocar a bateria da máquina parado na estrada bem naquela curva da Quebrada Nascimiento. Claro, só poderia ter sido ali, aí olhando a máquina percebi que com a luva eu devia, ser perceber, ter pressionado o cartão ao tirar a bateria e este saltou da máquina, por isto que logo a seguir deu memória cheia com 6 fotos, pois é a memória da máquina sem cartão.  A próxima conclusão foi que poderiam ter acontecido duas coisas, ou o cartão caiu diretamente no chão, ou enroscou na minha jaqueta e seguramente teria caído depois, pois na jaqueta não estava, só estaria por um milagre.  Eu lembrei que ao parar na curva, eu fiquei fora da faixa de rolagem, justamente para fugir da tangência da curva, caso algum veículo passasse por ali, então havia 50% de chance de o cartão estar lá, a não ser que alguém tenha também parado por lá e achado, ou ele tenha voado longe e caído no asfalto, aí algum carro poderia já ter passado por cima. No dia anterior certamente não, pois estava anoitecendo, como era cedo no dia seguinte, poderia vir a acontecer mais tarde, mas tudo isto era suposição.  Juro que mentalmente eu imaginei o cartão caído no chão de areia da lateral daquela curva.

Dali de San Pedro até aquele ponto da ruta 23, são uns 110km de distância, mas eu decidi que valia a pena voltar lá, pois não haveria como repetir aquelas fotos nunca mais na minha vida. Muito nervoso ainda, comecei a tentar me concentrar no que tinha que fazer, pegar os documentos, carteira, luvas, blusa e claro eu precisava abastecer a moto, pois com o que havia no tanque não chegaria nem a um terço dos 220 km de ida e volta, onde não há abastecimento.

Saí nervosamente rumo ao único posto de gasolina de San Pedro, por ser cedo não havia fila, eu logo abasteci, mas pareceu uma eternidade. Saí o mais rápido que pude e logo estava na ruta 23 acelerando rumo sudeste.  Claro que já estava um dia lindo, a moto sem bagagem alguma, nem o baú da moto eu peguei, pus o mínimo necessário na minha pequena mochila vermelha e só.  No início da Ruta 23 há aquele quebrachal dos dois lados da pista (o quebracho é uma árvore do deserto) e ali há as muitas cabras soltas que vivem sob a sombra daquelas muitas árvores. Passei com cuidado, pois elas cruzam a pista tranquilamente em bandos. Depois dali não preciso dizer que acelerei muito, tentando andar o mais rápido possível, mas rezando para não haver nenhum carro de polícia na estrada, pois o tempo que perderia seria crucial, além de todos os demais contratempos oriundos disto.  Eu andei a 120 / 130 km/h o tempo todo, exceto naqueles desvios intermináveis, porém sem bagagem eu nem dei bola para a areia, passei o mais rápido que pude por cada desvio. Me lembro de, em uma reta no asfalto eu ter esticado a 160 km/h por alguns kilômetros. Porém um Ford Eco Sport destroçado nas areias do deserto na lateral da pista, me fez pensar que era melhor ir um pouco mais devagar, porém não muito, claro. Em Toconao quase faço uma besteira, pois uma van resolveu ir muito devagar na minha frente, eu pensei em ultrapassá-la, mas resolvi esperar um pouco, foi minha sorte, pois passamos bem em frente a um posto de polícia rodoviária, que nem tínhamos visto na noite anterior. Claro que na frente do posto era faixa dupla né...  Tentando manter a calma e imaginando se alguma van igual àquela, cheia de turistas indo rumo as lagunas Miscanti e Meniques já tinha passado pelo meu ponto de destino e, pior, ter parado por lá.  Logo consegui me livrar da van e acelerar após a saída da cidade. Mais desvios, onde eu acelerava com vontade na areia e mais ainda quando vinha o asfalto. Passei por Socaire e sabia que estava perto, mas naquela volta parecia que não chegava nunca, e neste trecho vi muitas vans indo rumo as lagunas.

Cheguei na curva da quebrada Nascimiento e nem sequer parei a moto mas já ví o pequeno cartão brilhando ao sol na areia, exatamente como eu havia imaginado!  Peguei o mesmo, inseri na máquina e abracadabra!  Estava tudo lá!   

Neste momento, respirei fundo e senti meu corpo pesar pelo relaxamento após toda a adrenalina até chegar ali.  Fiquei alguns minutos, meio perdido sem saber o que fazer a seguir. Me lembro que fiz uma oração agradecendo os fatos de o cartão estar intacto, de eu ter chegado bem, apesar de ter corrido muito e também por ter acreditado na imagem mental que eu vi. Depois um pouco relaxado, vi um casal de hippies, saírem da lateral do curso d'agua andando calmamente e ao passarem por mim, nos cumprimentamos, eles muito magros e vestindo roupas surradas, apenas calça e camiseta, cruzaram a estrada e desceram pela parede rochosa do lado oposto em direção ao local onde o curso d'água também atravessa a pista e desce rumo ao infinito (chamado ali de Deserto de Atacama).  Isto deveria ser já umas 9h da manhã local, umas 11 h no Brasil. Então concluí que eles tinham dormido por ali em algum lugar e naquele momento os admirei e senti aquela "inveja saudável", pois o céu à noite por ali deve ser algo absurdo de lindo, tanto que o principal observatório astronômico do hemisfério sul e o segundo maior do mundo, está localizado no Atacama, a uns 500 km de distância ao sudoeste dali, deve dar até para ver discos voadores!



O Zeca na pousada El Camino del Inca

Onde o pátio é grande e cabem muitas motos
As nossas roupas em processo de "desinfecção solar"
Achei que eles tinham ido passear, mas estavam esperando (foto Zeca)
Resolvi então fazer uma visita com calma a Quebrada Nascimiento, entrei com a Suzi na baixada após a curva, prendi meu capacete e fui calmamente com minha mochila nas costas e máquina fotográfica na mão, seguindo o curso d'água no sentido oposto ao que ele corre. Fui devagar, para aproveitar a aura daquele lugar e também porque ali se está a 3850 m de altitude, ao caminhar com dificuldade me lembrei do nosso amigo o Kadú, pois me perguntei se aquele casal que passou por mim caminhando com tanta tranquilidade e desenvoltura eram reais...  Será que eram, como diz o Kadú, duendes?    Duendes hippies claro!

A pequena Quebrada Nascimiento é na realidade a lateral daquele campo rochoso que descrevi no dia anterior, originado por lavas vulcânicas, este caminho entre as rochas foi gerado por um pequeno curso de água de degelo que vem do vulcão Lascar, que fica ao lado do Vulcão Miscanti. Nesta época do ano eles não estão cobertos de neve, porém existe sempre uma pequena camada nos cumes, isto porque à noite naquelas altitudes de 5500 m para cima sempre neva. Então durante o dia, parte do gelo derrete, formando os canais das várias pequenas quebradas que descem para o Atacama neste trecho. As maiores por ali são estas, a Nascimiento que abastece Socaire, depois Jerê que dá vida a Toconao. A cidade de San Pedro vive da água que vem lá de outra ponta, que é a cadeia que forma a divisa com a Bolívia.  Nos dias de hoje a água da Quebrada Nascimiento, não faz mais o seu antigo curso, pois esta água foi canalizada pela lateral esquerda da mesma, é este canal que quando visto do leste para o oeste nos dá a nítida sensação de que a água está subindo e não descendo, mesmo você tentando forçar sua a mente a acreditar que aquilo é uma descida, o que de fato é, os teus olhos te dizem outra coisa.

Decidi ir acompanhando o canal até onde eu conseguisse, e por isto tive que cruzá-lo de um lado para o outro duas vezes, tendo que pular o seu 1m de largura aproximadamente.
As formações rochosas são lindas, logo encontrei uma pequena comporta, que controla o fluxo da água, pelo que entendi, se o volume aumenta então abre-se esta porta que deixa parte da água seguir seu antigo curso por dentro da quebrada.  Depois da comporta havia uma parede de pedras por onde a água passava por várias fendas, daí a única passagem era no lado oposto beirando a parede de rochas, ali havia um improvisado portão de madeira, porém não trancado, passei por este e bem lá na frente vi uma barraca armada. Conclui então que era do casal, e sendo assim, não eram duendes. Não fui até lá, pois como não vi ninguém, achei melhor respeitar o espaço deles.  Ali à noite deve fazer um frio absurdo, mas com uma fogueirinha acesa e enrolado em um cobertor, ficar ali olhando o céu deve ser uma experiência única.


A Suzi lá dentro da Quebrada
À esquerda beirando a parede de pedras, passa o curso d'água
Aí esta ele!
Água de degelo de cume de vulcão...

A comporta que controla o fluxo


Tem até cachoeira!
Lá na frente está a barraca dos Duendes
Olhando para trás na direção do Atacama
Tem-se a nítida impressão de que é uma subida para onde a água corre
Comecei a voltar calmamente, e aí me lembrei que antes de sair de San Pedro nervoso, pelo menos não esqueci, de pegar as velas para acender para os meus anjos da guarda, isto mesmo, não temos um só, principalmente quem anda de moto!  Isto porque eles também gostam de moto claro.

Na viagem de 2010 eu também acendi velas para eles, e foi aqui nesta mesma quebrada, quando passávamos rumo a San Pedro vindo da Argentina, este ano eu planejava acendê-las aos pés de algum vulcão na Bolívia, ou algum outro lugar que julgasse ser digno da homenagem. Antes de sair de San Pedro, mesmo nervoso, consegui me lembrar de por via das dúvidas, pegar as velas. Então, estando tão feliz por ter encontrado o cartão e por ter resgatado todo o registro fotográfico até ali, decidi não esperar mais para agradecer, pois de fato eles me ajudaram muito, aliás como sempre.  Encontrei um abrigo formado por uma grande rocha, peguei duas pedras planas que posicionei formando uma proteção ao vento, que passa constantemente por entre as rochas, não há lugar ali onde o ar fique parado. Acendi as velas, fiz minhas orações e sai feliz, apenas lamentando o fato de não ter mais velas para poder repetir isto lá pela Bolívia.



A ruta 23 na curva da Quebrada Nascimiento
O azul turquesa do céu do Atacama
Os vulcões Lascar e Miscanti
A Suzi a minha espera
Vou aproveitar este cenário, para discorrer um pouco sobre este assunto, contudo quem não tiver interesse, por favor, pode pular para a segunda marcação "<<<>>>" abaixo, pois a primeira regra a ser seguida por um bom Espírita é, respeitar todas as religiões e também as opiniões alheias.

                                                                 <<<     >>>
Quando eu tinha entre 11 e 12 anos de idade, me tornei ateu, pois nunca tinha ouvido até então a palavra agnóstico, portanto achava que ser ateu era simplesmente não acreditar em Deus, e não negar a sua existência. Hoje com todos os meios de comunicação à nossa disposição, temos acesso ao significado de ambas as palavras. Portanto eu não negava a existência de Deus, só não acreditava mais, portanto era agnóstico e não ateu. Mas isto ocorreu justamente porque eu tive até ali, uma educação católica com todos o seus ritos e dogmas.  Eu, que era muito racionalista com aquela idade, não aceitava os dogmas, nem conseguia ver justiça e bondade divinas, em uma única vida onde todos nós viemos com oportunidades e desafios tão diferentes uns dos outros. Eu me perguntava porque todo mundo não nascia lindo e bem de vida, pois apenas alguns poucos tinham este privilégio, onde há privilégio não há justiça, menos ainda bondade divina. Além disto, racionalizando mais, com 12 anos de idade, os meus hormônios me colocavam muito mais próximo das portas do inferno do que do céu, segundo os conceitos religiosos que eu havia aprendido até ali. Isto tudo tornou-se simplesmente ilógico e insuportável para mim. Então assumi uma postura agnóstica (mas na época dizia que era ateu). Felizmente isto não durou muito, pois entre os meus 15 e 16 anos, tive o primeiro contato com a doutrina Espírita.

A obra científica compilada por um homem lógico, um cientista, que foi Kardec.  Minhas perguntas enfim tinham respostas, sem dogmas, tudo lógico e claro, sendo a mais contundente a justiça de Deus ser explicada através das nossas múltiplas passagens por aqui, em condições diversas, onde aí sim, as oportunidades e desafios são iguais para todos e a eternidade (tente imaginar o "conceito" eternidade) não é mais definido para nós por uma mera, curta e atribulada "unica" passagem por aqui. No começo não foi fácil entender, mas depois tudo foi se encaixando, pois eu ficava encucado com o apagão de memória que sofremos quando voltamos em uma nova vida. Hoje depois de muito estudar, vejo aí mais um exemplo da bondade divina, pois há fatos em nosso passado, que se relembrados não nos permitirão progredir, por remorso, vergonha etc. Assim voltamos em um corpo em formação que nos limita as faculdades (a infância) mas que nos cria uma enorme oportunidade de aproximação, afeto e aprendizado com os que nos cercam. Depois, quando partimos desta vida, nossa memória passada volta em grande parte, mas ainda não totalmente, pois ainda carregamos algumas marcas que só poderão voltar à nossa consciência quando nossa alma estiver mais amadurecida.Temos a eternidade para isto, e aí sim o conceito de eternidade tem um sentido prático.

Temos a eternidade para aprender e evoluir, a eternidade para voltarmos aqui como negros, brancos, amarelos, vermelhos, ricos ou pobres, feios ou bonitos, e com isto amadurecermos nosso espírito. É muito importante esclarecer que, não estou aqui criticando o catolicismo, pois aprendi que todas as religiões que levam a Deus são boas e válidas. Apenas o que aconteceu comigo, foi que no meu estágio racionalista, o catolicismo ao invés de me levar a Deus, me afastou dele. Então deixou de ser útil para minha evolução, mas é útil para milhões de pessoas. Claro que eu me criei com um preconceito muito grande em relação às religiões de origem Africana, e depois isto se agravou conforme fui estudando os mecanismos das relações entre os que estão vivendo a experiência física e os que estão no outro plano, apenas invisível aos nossos olhos físicos, porém muito mais próximos de nós do que imaginamos. Hoje passados tantos anos e, felizmente com a oportunidade de ter aprendido um pouco mais, pude separar melhor as coisas. Claro que existem relações perniciosas que são exploradas por pessoas de má índole, isto aliás, existe em todas as atividades humanas, sejam religiosas ou não. Então existem sim, os malfeitos acordados entre ambos os lados, que tem muitos nomes, mas são generalizados aqui como macumba e no hemisfério norte como vodoo.  Contudo o mais chocante para mim, foi descobrir que isto é a menor parcela das nossas agruras, pois o que mais nos prejudica são as nossas próprias ações e forma de pensar, isto atrai para nosso convívio paralelo, sem que saibamos, irmãos que estão do lado de lá e comunam com os nossos desvios, acabam virando nossos companheiros sem que saibamos, nos influenciando negativamente muito mais do que qualquer imaginável vodoo. Dependendo da nossa conduta, isto pode fazer com que nossos amigos protetores não consigam mais nos ajudar, imaginem esta situação, como um filho perdido em algum vício e os pais lutando para salvá-lo, sendo as más companhias de vício os amigos do além e os adquiridos nesta vida. É exatamente isto, e pior ainda, é o que de fato acontece com as situações de vício real, pois há, a família desta vida, e os protetores do outro lado lutando para salvar o ente querido, por outro lado os amigos de vício deste e do outro mundo o arrastando cada vez mais para o fundo do poço.

Hoje contextualizo, no meu pouco entendimento, as religiões entre as mais ritualizadas e mais filosóficas.  Para mim o Candomblé é muito apegado aos rituais, o Kardecismo é puramente filosófico e a Umbanda está no meio do caminho entre os dois. Felizmente pude quebrar os preconceitos e entender isto melhor, o que me propiciou uma visão mais justa e um respeito por todas. Claro que para mim, pessoalmente, o Candomblé não me cativa, justamente porque é muito ritualístico, e racionalizando, isto perde o sentido para mim. Na Umbanda há uma ponta mais próxima do Candomblé, portanto mais tradicional, onde ainda predominam muitos rituais, que são bonitos, emocionam, mas eu me identifico mais com a outra ponta mais filosófica.

Foi daí que concluí, isto é minha conclusão pessoal, que os Anjos da Guarda do catolicismo, são os Orixás do Candomblé e da Umbanda, mas mais que isto, são os Espíritos Protetores do Kardecismo. São pessoas a quem amamos e que nos amam mais ainda, e estando do lado de lá, nos acompanham, nos orientam e nos protegem, na medida do seu estado evolutivo e do nosso. Assumem esta missão de nos acompanhar paralelamente e, se nós permitirmos, eles podem fazer muito por nós. Hoje existem várias casas Espíritas que ensinam e praticam o bem, usando as bases filosóficas e doutrinárias do Kardecismo e um trabalho de apoio e socorro aos necessitados que estão sob más influências, usando o apoio das entidades de luz que dão suporte à Umbanda, por isto, estas casas não possuem rituais, apenas trabalhos doutrinários e de atendimento. Estas casas de caridade, não usam mais identificações específicas como Kardecistas ou Umbandistas, pois procuram unir o filosófico ao prático em nome do bem. Hoje me identifico com estas, mas respeito e admiro a todas, por isto desta não comum homenagem com as velas. Não é algo que faço sempre, apenas em raras ocasiões, como forma de agradecimento e respeito, pois sei que para eles isto não é o mais importante, contudo é algo que vi e admirei nos rituais dos centros tradicionais que visitei, e aliás onde sempre fui muito bem recebido, então é algo simbólico, para mim, fazer isto em um lugar tão singular como aquele, ou algum outro como pretendia, é dizer aos meus amigos protetores, obrigado por estarem aqui comigo.
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Sai da quebrada meio quebrado, não é fácil ficar subindo e descendo de pedras e pulando cursos d'água a 3850 m de altitude, isto é só para duendes e hippies.
Coloquei a Suzi de volta na estrada para os mais de 100 km de volta, mas eu não estava mais com pressa, por isto decidi que ia parar onde desse na telha e fotografar, pois claro que havia muito espaço ainda no cartão de memória da máquina.  Saindo da curva daquela quebrada, há um ponto alto de onde se avista o Salar do Atacama, dali daquele ponto o horizonte era visível a uns 50 km de distância, não mais, devido a uma névoa seca.
Estava parado ali tentando, sem conseguir, uma foto que desse noção da dimensão, quando um motor home com placa e adesivo da União Européia, passou ao meu lado bem devagar, quase parando, me cumprimentaram, depois ficaram olhando a Suzi e conversando entre si. De fato não se vê mais por aí estas DRs antigas, ainda mais por estes lados.  


Ruta 23 próxima a Socaire e ainda a 3800 m de altitude
Vulcão Lascar
O Salar do Atacama perdido na névoa seca
Lá para cima o projeto ALMA

Eu não me lembro quantas vezes parei, mas foram muitas, algumas para fotografar, outras somente para observar, pois pela manhã com a luz do leste e depois diretamente acima, tudo é diferente. Meus companheiros de viagem, Magá e Zeca, não tiveram a oportunidade de conhecer esta paisagem, pois nossa chegada a San Pedro, foi em pleno breu noturno, uma pena. Inclusive consegui agora entender a dificuldade que tivemos com a estrada na noite anterior. Esta ruta, que era um tapete e muito bem sinalizada naquele Dezembro de 2010, está agora muito deteriorada, fizeram um recapeamento nas duas faixas de rolagem, porém deixaram uma pequena faixa central de meio metro, com o asfalto antigo, exatamente onde fica sinalização central que divide as pistas. Concluí que é a única maneira de fazer um recapeamento por aqui, pois do contrário, teriam que recapear e sinalizar antes do primeiro anoitecer, pois não há referência lateral alguma no escuro por aqui. Nós sentimos o drama na noite anterior. Sem a antiga faixa os acidentes seriam inevitáveis.

Na descida de Socaire para Toconao, há uma sequência de morros de areia no lado esquerdo, depois, mais adiante, um único isolado, tendo ao fundo a planeza do Salar de Atacama, este morro chama-se Face del Inca, pois no lado oeste aparecem os traços de um rosto, agradeci por ter podido voltar e ver tudo aquilo novamente.

Por ali, parei para uma fotos, e havia bem em frente aquela intrigante placa redonda, amarela com uma faixa diagonal preta. Até hoje não sei o que significa, e novamente prometi a mim mesmo que iria perguntar a algum chileno, mas claro que me esqueci.  Então, por enquanto, ficamos com a livre interpretação do significado de "proibido amarelar!" 



Ruta 23, descida de Socaire para Toconao
Agora dá pra ver a placa "proibido amarelar"
O lugar é lindo
Pena que o modelo não ajudou, lá atrás o Salar de Atacama
Registrado
E mostrado onde era!
À direita o fim da cadeia andina
No lado direito, sentido norte, está o projeto ALMA e atrás dos vulcões o Paso de Jama
Lá na frente à esquerda o morro Face del Inca, daqui não dá pra ver a face

Bem na curva que antecede Toconao no sentido oeste, cruzei com várias motos, eram brasileiros, pois havia uma com a nossa bandeira, eram duas BMW GS, duas Vstrom e outra que não identifiquei, talvez uma Versys, todas com 

garupas e baús laterais. Eu cumprimentei a todos, alguns acenaram respondendo, uma menina que ia na garupa de uma das motos acenou com uma mão e apontou uma filmadora na minha direção com a outra enquanto sorria, ela pelo jeito estava curtindo muito aquele lugar.  Certamente, se não vieram pelo sul desde Santiago, ou do norte pelo Perú, tinham vindo da Argentina pelo Paso Jama, estavam indo sem dúvida, visitar as lagunas Miscanti e Meniques, devem estar se perguntando até hoje o que eu estava fazendo, sem bagagem alguma, voltando àquela hora da manhã no sentido oposto.

Na reta entre Toconao e San Pedro, à esquerda está a portaria para o projeto ALMA, que são radiotelescópios de vários países instalados entre os grandes vulcões Lascar e Licancabur, aos pés dos cerros Purico e Toco. Isto tudo fica bem próximo de quem passa pelo Paso Jama, uns 10 km em linha reta, porém não são visíveis de lá. Eu fui lá para ver se havia possibilidade de visita, mas não havia ninguém na guarita, porém havia uma placa com informações dizendo que as visitas podiam ser agendadas por telefone, só que os dois últimos números do mesmo na placa, estavam apagados!  Não sei se propositalmente...  Bem, ao que parece, eles não estão interessados em visitantes por ali, que pena.  

Se bem que, apenas poderíamos tirar fotos das antenas, pois o que fazem ali é captar e estudar ondas de rádio e luz, oriundas das profundezas do Universo.  Ao contrário do que se possa imaginar, não é o som que eles estudam, são as imagens formadas por ondas de inúmeras frequências, que não são visíveis ao olho humano. Tá aí, mais uma prova de que não é porque não vemos que não existe!

Projeto ALMA (foto Internet)
Na frente uma antena japonesa de 7 m, atrás uma norte americana de 12 m (foto internet)
Pôr do sol no projeto ALMA (foto Internet)

Eu estava tranquilo, pois achava que os meus três amigos estivessem fazendo alguma coisa, no mínimo andando pelo centro de San Pedro, mas não foi isto, estavam me esperando, e meio preocupados, pois eu demorei muito.  Lhes pedi desculpas, mas eu estava tão feliz por ter achado o cartão de memória!

Então antes de sairmos para almoçar, eu tratei logo de descarregar as fotos no netbook.

Eu feliz por ter encontrado o cartão, já descarreguei no netbook logo que cheguei!
Saímos então com três objetivos, almoçarmos, fazermos câmbio e procurarmos passeios para o dia seguinte.  Eu já nem me lembro se almoçamos ou fizemos câmbio primeiro, me lembro bem do senhor que trocou dinheiro para nós em uma lojinha, onde entraram umas belas jovens. Inclusive compramos uns bolivianos (dinheiro), pois em dois dias deveríamos estar deixando o Chile e entrando na Bolívia. Ali em San Pedro é muito fácil fazer câmbio, pois os valores são praticamente os mesmos em qualquer lugar e as taxas são justas. Não importa se são dólares, pesos argentinos, chilenos ou bolivianos.

Escolher um lugar para comer foi uma piada, andamos muito e não conseguíamos entrar em um acordo. Finalmente escolhemos um lugar, havia salmão, o preço era muito bom, foi o que o Magá escolheu. Eu tonto, com muita fome, resolvi escolher um frango com arroz e batatas, pois me pareceu que o salmão não iria me satisfazer. Me arrependi, pois o Magá, que é exigente, só elogiava o prato enquanto comia!   Então decidi que voltaria ali para experimentar o "maravilhoso salmão".  O Zeca pediu uma sobremesa e também só elogiava, claro que nós ficamos "secando" a sobremesa dele.



A procura de câmbio
O Andrezito estava com fome 
O "Salmão" do Magá, segundo ele estava delicioso! 
Eu contando alguma mentira e o Zeca fazendo cara de que estava acreditando
O Zeca, o André e o Magá
Esta sobremesa do Zeca !
O dia que havia começado ensolarado, passou para um nublado com mormaço. Na Calle Caracoles, que é a rua principal de San Pedro é "paso peatonal", ou seja, não passam veículos, só pedestres, do outro lado quase em frente ao restaurante entramos em uma agência, mas como havia muita gente lá dentro, ninguém deu a mínima para nós, então entramos em uma ao lado.  Uma boliviana, acho que se chama Maria, nos atendeu com muita calma e atenção, e foi conversando com ela, enquanto escolhíamos os passeios que, descobrimos que a entrada da Bolívia pelo Paso Jama, estava fechada e sem previsão de abertura!  Lá se ia nosso sonho dourado...  Tanto planejamos fazer o circuito das lagunas e os desertos de Siloli e Salvador Dalí, este trecho seria a cereja do nosso bolo nesta viagem.

Vamos ao motivo do fechamento. Na fronteira sul com o Chile, a região boliviana desde atrás do vulcão Licancabur até a Laguna Colorada, forma o parque nacional Eduardo Alvaroa. Este é um trecho muito visitado, pois há excursões de 4x4 quase que diárias que saem de San Pedro rumo ao Uyuni e vice-versa.Neste trecho do parque, existem comunidades que vivem do turismo, porém as taxas que os turistas pagam para visitar ou passar por certos locais, são recolhidas pelo governo central. O problema é que La Paz não estava lhes devolvendo a parcela devida. Resultado, uma "paro geral" por ali, incluindo a imigração e a aduana.  Segundo a Maria, eles estavam fazendo a tal greve nesta época, pois é quando há o maior movimento, causando assim um prejuízo ao governo de forma a lhes pressionar.
Não havia previsão de retorno, poderia ser após o Natal ou somente após o ano novo, de qualquer forma quebrou nosso planejamento, tínhamos que pensar em um plano B.

Pelo menos resolvemos o dia seguinte, onde o Zeca e o Magá iriam visitar os Geisers El Tatio, eu e o André não, pois já conhecíamos, além do que a van passa pegando o pessoal entre 4:15 e 4:30 h da manhã. Nós dois iríamos então a Toconao, visitar a Quebrada de Jerê, onde eu pretendia tomar banho nas águas correntes de degelo. Já na parte da tarde, iríamos todos juntos no mesmo passeio para as Lagunas Cejar e Tebenquiche, em pleno Salar do Atacama.


Ruas simples de San Pedro
O Zeca fotografando o André
A Calle Licancabur (cujo vulcão aparece lá ao fundo)
O Magá e à esquerda a entrada da pousada Camino del Inca na Calle Licancabur
Lateral da igreja de San Pedro, eu queria esta foto com a luz da manhã, mas... 
Voltamos para a pousada, pois o Zeca precisava encontrar um soldador, para definitivamente resolver o problema da barra transversal que apoiava os baús laterais em alumínio da sua moto. O André e o Magá foram junto com ele, eu disse que não ia, pois estava bem cansado, e estava mesmo.Pretendia descansar um pouco, mas na realidade fiquei mesmo foi procurando no Google Earth, uma alternativa de caminho. Nós havíamos nos lembrado da sugestão do Ed Cotait, de um retorno por Ollague, na época do planejamento da viagem. Então procurei as referências, distâncias, cidades, abastecimentos, tipo de piso etc. Encontrei o caminho saindo por Calama, bem atrás da maior mina de cobre do mundo, Chuchicamata.  Isto me tranquilizou, pois já tínhamos um plano B.

Eles voltaram lá do soldador, mas o Zeca não estava feliz, pois o cara meteu a faca nele, não me lembro quanto, mas custou um fortuna, comparando ao preço que ele havia pago em San Antonio de los Cobres, o André tentava lhe acalmar lembrando que foi caro, mas foi um belo serviço.


Acharam um soldador
Próximo à ruta 23, de onde dava para ver o Licancabur
A feia entrada de San Pedro, ali na frente à esquerda a chegada do Paso Jama
Para lá Toconao, Socaire e o Paso de Sico

O Magá e o Licancabur
Olhem como o dia mudou em relação à parte da manhã
O suporte dos baús recebeu um trato
Agora vai aguentar o tranco!
Eu não me lembro do que fizemos à noite, onde comemos, mas acho que foi quase ao lado da pousada, onde o André descobriu um lugar especializado em frango. O lugar é muito simples, um buteco pra dizer a verdade, mas os frangos assados, metade ou inteiros são disputados, há fila de espera, pois o preço é muito bom.

Fomos dormir, eu finalmente tranquilo, além do que não teria que acordar às 3h da manhã como o Magá e o Zeca.

3 comentários:

  1. Olá Ronaldo!
    Tenho acompanhado sua narrativa com muito interesse. Parabéns!
    Em particular seus comentários sobre o espiritismo.
    Há cerca de 10 anos, tínhamos (eu e a Cida) as mesmas convicções (e você sabe o que aconteceu).
    Respeito suas escolhas, mas como cristão, é meu dever lhe relembrar um trecho das Sagradas Escrituras, na qual Jesus nos diz: "Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém chega ao Pai senão através de mim". João 14:6.
    Hoje entendemos que o espiritismo foi uma etapa de intermediária (preparação) entre a incredulidade e a vida cristã que temos hoje.
    Lembra do que você escreveu na viagem de 2010/11 em 04/01/2011 Caracollo - ônibus que você seguiu?. Pense nisso. Grande abraço. Altino.

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  2. Olá Altino tudo bem? Obrigado por acompanhar o blog, espero que esteja gostando.
    Sempre que lembro do Serro Paranal, lembro de você, estes dias vi um documentário falando sobre a instalação do próximo telescópio, se não me engano terá um espelho de 12 metros! Ficará pronto em 2016. Que tal?
    Sobre o espiritismo, não entendi o que você disse, pois somos todos "cristãos" sim.
    Lá no centro que frequento, começamos o culto com a leitura do Evangelho, e terminamos com a seguinte frase: "Agradecidos que estamos, damos por encerrados o atendimento desta noite com a prece que Jesus nosso pai nos ensinou" e rezamos o Pai Nosso. Lá é um centro Kardecista que trabalha com entidades da Umbanda que já se desligaram das coisas materiais. São entidades que estão tão à nossa frente, que se apresentam a nós da forma mais humilde possível. Justamente o que eu tentei explicar é que lá, não há danças, ninguém bebe ou fuma, nada disto, mas apesar de não frequentar os lugares onde há, aprendi a respeitar, aliás como a todas as religiões que levam a Deus.
    Grande Abraço!

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  3. Imagino seu desespero ao perceber a perda do cartão, graças à Deus vc o encontrou ou esse blog não estaria tão rico de memórias..

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