quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Dia 20/12/2012 - Subindo os Andes em direção a Cachi (a ruta 40, cactos, areia, poeira e tombos)


Apesar da vontade de comer, manerei no café, hoje tem altitude!    Então temos que aplicar as regras de segurança, comer pouco e algo leve, porém tomar muita água, quanto mais melhor. Fazer o inverso disto resulta em "Punar" (ou seja cair no mal de altitude) onde dor de cabeça, náuseas e até desmaios acontecem facilmente.  A palavra Puna quer dizer lugar alto, aliás, por aqui isto significa muito alto!

Fizemos o retorno a 50 m da frente do hotel e contornamos o fim da plaza San Martin, para podermos entrar novamente na Av Hipolito Yrigoyen sentido sul, o Zeca estava roteando o caminho, por isto lhe dissemos para ir na frente, assim um só GPS nos guiaria, sem que houvesse confusão de rotas de dois ou mais. Mesmo assim nos enrolamos um pouco e demos umas voltas até que conseguimos finalmente descer pelo caminho certo, porém o André tinha a preocupação de achar a cola para fixar o parafuso do ar do carburador. Fomos descendo a Av. Hipolito até que ao cruzar a Av. Independência, o André viu algo, então decidimos parar no posto de gasolina no lado oposto, aproveitamos para abastecer.  Me lembro que enchemos algumas garrafas PET com combustível também, o abastecimento foi demorado, uma menina bonitinha, mais lenta que só, fez os abastecimentos. Aproveitamos para comprar água gelada, o calor já era forte. Isto devia ser já umas 9:30 h da manhã. Tudo bem, o trecho até Cachi, apesar de desconhecido, não é longo.


O Magá e seus litros de gasolina verde (foto Zeca)
No norte da Argentina, está em dúvida?  Então leva (foto Zeca)
O André achou a cola, já tratou de travar o parafuso, então após abastecer, pudemos seguir. Saindo do posto, uns 200 m a frente já saimos à direita na Av. Monsenõr Talavera e fomos em direção a rotatória Limache, neste trecho a Av. Talavera é larga de duas pistas, separadas por uma mureta central, porém tem muitos semáforos. Passamos por uma moto que devia ser uma 125 cc, 2 tempos toda mexida e enfeitada, com o escapamento aberto, fazia um belo barulho, nós ficamos ao seu lado em um semáforo, quando este abriu ele saiu com tudo, porém no próximo farol o encontramos novamente, e foi assim por vários, até que ele saiu para um bairro à direita, com sua moto exótica.

A rotatória Limache é onde se encontram as Av. Talavera e Paraguay (que vem da Av. Jujuy), por onde saímos em 2010. Nesta rotatória seguirmos à direita e pegamos a ruta 51 que, subindo pela bela Quebrada del Toro, vai direto a San Antonio de Los Cobres, 170 km distante dali, foi o caminho que fizemos em 2010. Seguindo a esquerda pega-se a ruta 68 que desce para Cerrillos e vai até El Carril, descendo para o sul nos leva para o Paso Las Goteras por onde vamos interceptar a ruta 40 que vindo do sul, sobe para San Antonio de los Cobres.  Nosso destino é o mesmo de 2010, San Antonio, porém desta vez vamos dar uma voltinha pelo sul, passando pelo parque nacional Los Cardones e por Cachi. Assim trocamos um tranquilo trecho de 170 km que se faz em meio dia, por uma emocionante volta de 350 km a ser feita em dois dias.

O plano por trás disso era de conhecermos Los Cardones, e rodarmos um trecho da lendária ruta 40, conhecermos Cachi e passarmos por Abra del Acay a quase 5000 m de altitude.
Daria para se fazer em um dia, saindo bem cedo, porém planejamos em dois dias, pois aí começava a subida dos andes, isto tem de ser feito com calma, para podermos nos aclimatar, sem "punar", e claro, também para podermos conhecer os lugares com calma.  Foi mais uma vez uma decisão acertada, pois o dia seguinte foi "punk".

A Ruta 68 passa por muitas pequenas cidades, e como é de pista simples, tem que se ter calma e cuidado, porém estávamos andando meio acelerados, íamos ultrapassando os carros e caminhões nas primeiras oportunidades, em um local, não me lembro onde, acho que entre Los Cerrillos e La Merced, quase fizemos uma ultrapassagem com faixa contínua, ainda bem que não fizemos, pois havia um posto da Gendarmeria no lado esquerdo, nós vimos antes, então passamos devagar, os guardas ficaram nos olhando sérios, mas não nos pararam. Continuamos em um ritmo que queria ser acelerado, mas não era, pois a toda hora passávamos por uma área urbana, com semáforos e outros obstáculos.

Eu seguia meio tenso, pois não é o meu ritimo, eu prefiro sair bem cedo e ir mais devagar, curtindo o trajeto, gravando mentalmente o caminho, os lugares e os eventos, mas nesta viagem estávamos praticando o oposto disto.

Cruzamos a ponte sobre o rio Rosario, que é um rio de degelo dos Andes, e logo a seguir entramos em El Carril, a terceira das cidades maiores neste trajeto, Los Cerrillos, La Merced e El Carril.  Dentro de El Carril, há a saída para a ruta 33 que finalmente nos fará começarmos a subir os Andes. Demoramos um pouco para cruzarmos a área urbana, mas depois por um trecho plano e reto de 10 km, começou a subida.  Inicia-se por um trecho estreito, cheio de curvas, porém ali a vegetação é quase tropical, muito verde, fazendo a estrada lembrar trechos de serra no Brasil. Dez quilômetros à frente, depois de muitas curvas feitas a 40 km/h, o asfalto termina e passa-se ao lado de uma enorme parede de rochas à esquerda onde a estrada se estreita entre esta e o rio à direita, ali há uma placa "Paso Las Goteras", o visual é lindo.




Neste dia não tinha "goteiras", mas dá pra ver água escorrendo nas pedras
Isto era o que o Zeca estava vendo parado lá  (foto Zeca)
Agora mais perto (foto Zeca)
O Zeca e o Magá
Eu já estava do outro lado da ponte
Ruta 33, observem a mudança da paisagem à frente
Curvas e mais curvas
Vamos subir?  (foto Zeca)
No levantamento da viagem, para mim constava que era asfalto até o alto dos Andes, lá por Los Cardones, mas ali na Quebrada do Rio Escoipe, acabou o asfalto, porém era só um trechinho de 4 km, pois ao chegarmos à ponte metálica que nos levou à margem direita do rio, o asfalto recomeçou.  A subida começa a aparecer, pois ali na ponte ainda há em volta uma vegetação verdejante, porém nas montanhas no entorno já se começa a ver a aridez de altitude. Uns 10 km depois da ponte o verde já não se faz mais tão presente, começa a rarear.   Mais 10 km à frente, passamos pela ponte com saída para Malcante onde há o encontro de um grande afluente do Rio Escoipe, em ambos nesta época não se vê quase água, apenas um fiozinho lá no meio de um largo leito de pedras e cascalho, porém estes rios viram enormes corredeiras na época das chuvas e também no fim do inverno quando começa o degelo. Por ali, ainda 1900m de altitude, porém estávamos seguindo rumo a Cuesta del Obispo, ali sim a subida é forte.

As placas na ruta indicavam, Payogasta, Seclantas e Cachi, que era nosso destino para aquele dia, a subida foi indo suave e contínua, até que a 2400 m de altitude começou uma sequência de fortes curvas e subidas, o asfalto sumia e voltava em curtas sequências, era a "Cuesta del Obispo".  Em vários lugares, havia fluxos de água cruzando a pista em curvas fechadas de quase 180 graus, pelo jeito são águas de degelo que descem as encostas por suas valas de erosão, estávamos atentos, pois começávamos a nos aproximar dos 3 mil metros, combinamos de fazermos as paradas estratégicas, e deveríamos parar lá por volta dos 3200 a 3500 m. Foi o que fizemos, paramos por uma meia hora, ou mais, em uma subida, onde havia um restaurante bem simples na lateral direita da estrada e uma barraquinha de produtos artesanais no lado esquerdo.  Ficamos ali fazendo hora, até que uma senhora acompanhada de um menino e um cachorro, apareceu. Comprei figos secos e o Zeca ameixas ou amendoins (não me lembro mais). Ela nos disse que o rio fez estragos por ali meses antes, mas que agora a estrada está normal, boa notícia.



Mas a estrada é linda

Primeira parada estratégica

O que se vê dali
À esquerda do Zeca um cactus seco, à direita ele lhes apresenta um vivo.
O André feliz
O Zeca também

O Magá fazendo pose
Eu, a senhora que nos vendeu frutas secas e o cacchorrão, o menino não saiu na foto

Partimos, porém a altitude decresceu ao invés de subir, derepente o asfalto acaba novamente e começa uma sequência de curvas onde se vai de 2800 m a 3350 em 11 km, agora sim, subiu, lá em cima onde o asfalto recomeça, chama-se Piedra del Molino, onde há uma capelinha. Em todo este trajeto, desde a parada principal, fizemos inúmeras pequenas paradas, pois o visual é lindo, e como sempre nos Andes, em poucos kilometros o céu azul ensolarado torna-se nublado e vice-versa.

Em uma das paradas, colocamos as blusas e comemos umas ameixas secas, a altitude começa a se mostrar. Já estávamos dentro do parque "Los Cardones". O lugar é lindo, requer calma para se subir, para a apreciação e para a aclimatação.

Quando passamos lá no alto pela Piedra del Molino, o ponto mais alto, o céu estava encoberto, mas uns 5 km à frente o céu se abriu em um sol maravilhoso. Ali fica claro que se chegou ao ponto mais alto, pois como acontece nas cuestas das quebradas Chilenas na ruta 5, começou um plano com retas. O asfalto voltou a aparecer e há uma bifurcação, a ruta 33 vira à direita e em frente começa a ruta 27. 
Bucolismo (foto Zeca)
Ruta 40, aos pés da Cuesta de Obispo
Loco, tu viste estos tipos? Uno de ellos es un maricón!  Muhh

No vale

Magá, Zeca e Andrezito. O sol aparecia e se escondia
A estrada passa ali?   Passa sim.
Subindo um pouco
Já estamos nos domínios do parque Los Cardones

O que estão olhando ?

Isto !
Lindo não é?
Eu, Zeca e André


Ainda não chegamos no alto
Seguimos pela ruta 33 e depois do entrocamento há uma reta de uns 5 km, ao fim desta uma sequência de curvas e de repente você sai com uma vista monumental, um horizonte gigante, ali começa a Recta del Tin-Tin, não sei se o nome é uma homenagem ao personagem de desenho de Hergé, seguramente ele e seu esperto amigo Miluo gostariam de ter passado por ali !  É uma reta perfeita de 11 km, que segue rumo Noroeste, após esta, a ruta 33 passa por um trecho de serra e sai em Payogasta 27 km à frente, e 12 km após Cachi, tudo por um belo asfalto!   Porém nós queremos aventura! Então cruzamos por dentro do parque Los Cardones para encontrarmos a famosa ruta 40 bem antes de Cachi. Percorremos apenas 2 km da reta del Tin Tin e saímos à esquerda para a ruta 42, puro rípio!

Muitas paradas para contemplação


Agora sim, o topo!  Após a subida da Cuesta del Obispo Ruta 33

Olha a foto que o André fez de mim e da Suzi
Após a bifurcação com a ruta 27 a ruta 33 virou um lindo asfalto
A "Recta del Tin Tin", vai terminar depois de Cachi, mas nós saímos à esq. logo após esta foto
O cenário é maravilhoso, os três primeiros quilômetros planos, em um cascalho solto terminam em uma sequência de curvas e subidas, passando pelos "Los Colorados", morros vermelho alaranjados, o deserto em sua plena expressão, a aridez colorida e os cactus gigantes (os Cardones).  Começou o off-road da viagem!

Atravessar o parque Los Cardones pela ruta 42, é lindo, mas eu quase cai muitas vezes, estava tenso, o piso mudando constantemente, aí está o problema, você pega trechos de chão firme batido, de repente você entra em um trecho de cascalho misturado com areia ou simplesmente areia pura.  O problema é que nestas horas tem que acelerar, regra número um do offroad "na dúvida, acelere", porém não pode ser muito, apenas o suficiente para passar com a roda traseira "tracionando" o que equilibra a moto e alivia a roda dianteira, que é a que derruba a gente quando afunda e ou sai de lado.  Nesta viagem eu decidi deixar os óculos de lado, pois melhoram minha visão a curta distância, mas tiram a minha visão periférica. Porém comecei a sentir a dificuldade de identificar as mudanças de terreno à distância.  Este era um problema que eu não tinha dois anos atrás, por isto só me sentia seguro rodando mais devagar, assim conseguia ter mais tempo para identificar algo diferente à frente e preparar a reação mais adequada.  O André e o Zeca, estavam se divertindo, eles além de pilotarem muito, tem autoconfiança elevada, o que estava me faltando. Já o Magá não tinha, até esta viagem, experiência pesada de offroad, ele teve um primeiro contato lá na Canastra no meio do ano, o que aliás lhe animou a participar desta viagem aqui. Mas ele também estava sofrendo, no caso dele pela pouca experiência, porém compensada pela juventude, ele pegou o jeito rapidinho.  Eu mesmo tendo andado tanto por aí estou sentindo a idade me cobrar algo, o que não acontece com o Zeca, ele parece um garoto!

Nós paramos algumas vezes para fotografarmos o lugar, foi em uma destas vezes que eu que vinha atrás, encontrei o Zeca caído, mas a moto dele estava na posição voltando, ele que ia na frente, parou e decidiu voltar acho que para tirar uma foto, mas ao manobrar a moto esta escorregou na areia. Claro que nós fotografamos e tiramos muito sarro dele, foi o primeiro tombo da viagem, eu me perguntava quando seria o meu... Mas ele tirou a situação de letra, fazendo até pose com o pé sobre a moto caída.

Estávamos com as jaquetas, pois apesar do sol havia um ar gelado em movimento, ao pararmos o sol ardia. Porém a partir de um certo ponto começou a esquentar de vez, isto porque estávamos descendo para o vale onde ficam Secantlas e Cachi, Descemos de 3500 m para 2100 m de altitude. Mais adiante na saída de uma curva quem caiu foi o Magá, era um arenal com cascalho, foi um tombo besta a baixa velocidade, mas daqueles que machucam o moral, eu tentei lhe animar, dizendo que aconteceu o mesmo comigo na Rutas y Quebradas I lá em Olacapato, por onde aliás iríamos passar novamente e onde eu tinha certeza que cairia novamente, devido ao enorme poço de fesh-fesh que toma toda a estrada.  Ele ficou bravo e nós nos divertíamos com isto, logo logo seria a minha vez de ser zoado, eu pensava.



Inicio da ruta 42, saindo 2 km à esquerda na reta del Tin Tin
Mudança radical de piso e de cenário
O André pira!
Outro "detalhe" da ruta 42
Estamos em pleno parque Los Cardones

São eles (os cactus) os Cardones que batizam  o parque
Passei e não entendi, como ele foi ficar assim voltando?
Tentou voltar e perdeu o pé de aopoio
Mas o Zeca tirou de letra, ficou muito legal esta foto!


Só estando lá para entender
Enquanto isto, eles calmamente observam
Apesar do sol, estamos de jaquetas, o vento na altitude. Até aqui não cai!

Só diversão né André!
Agora foi a vez do Magá!
Mas tudo bem, o moral estava alto!
Desde a saída na reta Tin Tin até o encontro da ruta 42 com a lendária ruta 40, são apenas 30 km, mas são lindos. Bem no encontro, mas já na ruta 40 há uma pequena ponte (que se chama Colte) sobre o rio Calchaqui que alimenta a quebrada de Las Conchas.  Todos, que estavam à frente, pararam sobre a ponte, eu que estava atrás tirei uma foto deles sobre a ponte, porém quando seguimos e eu passei sobre a ponte, ao olhar para a direita fiquei encantado com a beleza do cenário, um canal de águas límpidas passando por entre duas altas paredes de rocha áridas.  Contando que eles já tinham fotografado aquilo, eu não quis novamente tirar as luvas, pegar a máquina para a fotografia, além do que, se viesse um carro eu estaria impedindo a passagem. Fiquei com a foto mental e descobri depois que não havia foto, mas uma filmagem com a Go-Pro do Zeca.


Ruta 40, a ponte Colte
Era isto que eles estavam vendo,  Rio Calchaqui
Ruta 40, margeando o rio.
Após a ponte há uma subida em curva que nos leva a um entroncamento, seguindo a direita, vai-se para Cachi, são apenas 20 km dali até Cachi, porém foi muito tenso para mim, pois havia muito cascalho e areia, com trânsito de veículos nos dois sentidos, muita poeira, o que dificultava a visão.  Eu não queria de jeito algum cair por ali, pois pensava que algum carro poderia não me ver caído devido a poeira. Neste trecho há muitas habitações às margens da ruta, mas poeira, muita poeira... e areia, em uma reta todos aceleraram, pois era um longo arenal, eu que vinha atrás fiquei às cegas em meio a nuvem de poeira, meu medo, veículo em sentido contrário, mas saí desse mal pedaço, que parecia não ter fim, ainda em cima da moto.  Em um trecho havia árvores cercando a estrada, formando uma sombra, e neste trecho havia uma curva fechada à esquerda, areia pura. O Magá que estava bem na minha frente, entrou na curva meio rápido e freou, como ele é alto, pôs os dois pés no chão e segurou a moto, eu tive que frear e, ao desviar dele a roda dianteira da minha moto virou, eu não caí por milagre.  Quando a moto pendeu para o lado direito, o pior lado de pé de apoio, não sei como, consegui segurar, ufa!  Ainda não foi desta vez...

Neste trecho, a ruta havia se afastado do vale do rio Calchaqui, mais adiante ela volta a se aproximar do rio, e em um destes trechos há um muro de pedras do lado direito. Nós paramos ali sob o sol, eu já andava sem a jaqueta, com esforço subi no muro e me sentei sobre ele, com o vale às minhas costas, um pouco de descanso. Eu não sabia, mas já faltava pouco para Cachi.


Parada para descanso, depois de comer poeira


Sobe e desce, a cabeça fica assim

O Zeca como sempre inteiro
Eu estava cansado, mas consegui subir neste muro
A vista atrás do muro
Estamos chegando
Chega-se a Cachi, vindo pelo sul, por uma subida em curvas, formando um "S". Na entrada da cidade, há uma bifurcação e nós seguimos à esquerda continuando na ruta, paramos em frente a uma linda construção rosada, é o Hotel ACA. Todos nós procurando alguma sombra, pois o sol era ardido demais. Nós tínhamos já o nome da pousada onde iríamos ficar, chama-se Nevado de Cachi, por um instante achei que o ACA fosse a pousada, mas foi só olhar melhor para ver que não era, nem pelo nome, nem pelo "naipe" do negócio.  É um contraste, pois a rua em frente para baixo tem construções pobres, contrastando com aquela imponente construção rosada. Em uma destas construções simples havia um mercadinho muito pequeno, mal cabíamos todos lá dentro, compramos água e o André tomou uma coca, claro! (como ele gosta disto).

Bem, faltava agora achar a pousada, que nos foi indicada pelo Taz. Entramos na rua perpendicular logo em frente à sombra onde eu havia deixado a Suzi.  Depois viramos à direita novamente e passamos sobre uma ponte que nos levou para fora da cidade. Meio perdidos, concluímos que não era por ali, pois havia uma bifurcação e duas estradas. Bem na bifurcação havia uma pequena construção com uma placa que identificava o lugar como de venda de artesanatos.  Um casal jovem, meio hippie, apareceu na frente e nós aproveitamos para perguntar, nos disseram que havíamos saído da cidade, tínhamos que voltar e que a pousada era atrás da igreja. Naquele momento nós não sabíamos, mas estávamos na bifurcação onde se sobe para o aeródromo à direita e o vale dos arroios que vem direto da face oeste dos Andes à esquerda.

Voltamos e rodamos umas duas vezes por algumas ruas até que achamos a pousada, na realidade uma porta com uma placa ao lado.  Batemos à porta e uma senhora veio nos atender, havia vagas porém a calçada era muito alta, mas ela com uma força de homem, pegou uma enorme tábua e com desenvoltura colocou-a rapidinho entre a rua e a porta, nos disse que outras motos já haviam passado por ali.  Ok, com cuidado para não cairmos com as motos pesadas das bagagens, entramos um a um. Lá dentro um pátio com uma linda parreira, fui direto para lá e coloquei a Suzi à sombra dela, colocamos as motos ali, o Zeca colocou a dele no lado esquerdo, fora da parreira, mas com a sombra do corredor entre os quartos.  O lugar é simples, mas muito agradável, havia os quartos embaixo e vi que subindo uma escada à direita havia quartos lá em cima. Eu optei pelos de cima, pelo fato de ter visto que lá tinha muito sol e também um pouco de privacidade. Decisão acertada, pois além de ter mais luz, também estava fácil para colocarmos nossas coisas ao sol, principalmente a roupa que já estava a esta altura da viagem começando a ficar "radioativa".  Eu e o André ficamos com o quarto lá do final, junto aos telhados vizinhos onde deixamos as roupas sobre as telhas, nossas botas e meias no chão e sobre umas cadeiras, o sol ali em cima é fortíssimo.  O quarto, apesar de pequeno, era muito agradável, pela claridade interna, com aquele ar de construção do deserto, com paredes rústicas, os móveis quase todos feitos com madeira de cactus, davam um ar diferente, apesar de ser tudo muito simples, gostei do lugar.

Depois de um banho restaurador, a próxima prioridade era o almoço, já no meio da tarde, pois deviam ser umas 2 ou 3 da tarde. Por sorte havia um restaurante ao lado da pousada, depois percebi que são na realidade anexos, há uma porta na cozinha do restaurante que dá para aquele pátio da parreira.

Sentamos em uma mesa no lado de fora e fomos atendidos por uma menina muito simples, de pele bem morena, ela ria das nossas palhaçadas. Até que afinal decidimos o que comer, eu já não me lembro mais, porém me lembro que a comida estava muito boa.  Não demorou muito para que tivéssemos a companhia de vários cachorros que ficaram deitados aos nossos pés em volta da mesa.  Eu me lembro que havia algo muito apimentado e também que o vento dava rajadas e quase virava o guarda-sol que cobria a mesa.

Após o almoço, fomos descansar, quem conseguiu tirou um cochilo, o que não foi o meu caso, pois fiquei por ali andando e observando aquela tarde quente e calma de uma cidadezinha de deserto.

Entrada de Cachi, a Suzi parada na primeira sombra

A pousada ACA, o negócio ali é bão
O Magá está la na outra sombra à frente

O Zeca e o André em outra do outro lado da rua, sol fortíssimo
Achamos!  (não é um hotel)
Que luxo, sombra de parreira, carregada!
A moto do Zeca no outro lado (na sombra é claro)
Pequena, simples, agradável e com estacionamento!
Agora sim né André?

Banho tomado e roupas condizentes com a temperatura
Zeca e Magá, no aguardo do almoço
Nós também
Este almoço foi uma delicia!
Produto de Cachi, pimenta!
Sempre temos boas companhias
Na realidade Cachi não é tão pequena assim, está na confluência de dois vales, na realidade duas quebradas, a do rio Calchaqui e a dos Arroios. Como há muita fertilidade, há o cultivo de vinhas e também de pimentas. Os vales ficam a 2300 m de altitude, cercados por elevações de 3000 a 3500 m. Dali em alguns pontos é possível ver ao longe o Nevado de Cachi, a majestosa montanha que empresta o nome à pousada, eleva-se a mais de 6000 metros de altitude, por isto mantém o seu gelo eterno sobre os cumes.  Por estes dois vales se estendem muitas propriedades e pelo jeito muita gente vive ali.

Eu divagava sobre a vida, pensava sobre a viagem e o que estava por vir. Há apenas algumas horas atrás estávamos em uma grande cidade, Salta, e agora menos de 200 km distantes de lá, estávamos em outro mundo, com um bucolismo daqueles.



Na preguiça da tarde
Uma tarde bucólica
Gigantes nos rodeiam
Quando o fim da tarde chegou, tratei de recolher todas as minhas coisas que estavam em processo de "desinfecção" ao ardido sol dos Andes, já fui deixando tudo arrumado, pois no dia seguinte, se saíssemos cedo, poderíamos visitar o viaduto La Polvorilla em San Antônio de Los Cobres à tarde. Como os dias estavam lindos, eu esperava poder voltar lá, pois quando fomos em 2010, o céu fechou em um cinza agourento, esfriou mas não choveu naquele dia, por isto as fotos que temos de lá não são bonitas como o lugar o é.

Conseguimos reunir todos e fomos a pé para a praça principal, todo mundo descansado, nada de pressa. Ficamos vagando por lá, eu estava procurando alguns ângulos para fotos, fiz várias tentativas mas não consegui nenhuma "pintura". A praça central tem umas palmeiras altíssimas e havia uma lua nova no céu, eu fiquei tentando uma foto com ambas, mas não deu jeito. Ao lado da igreja há uma construção comprida com um corredor externo com arcos, lembrando um pouco o estilo mouro.

Um cachorrão preto muito bonzinho começou a nos acompanhar e o André o batizou de Lobão, ele ficou andando com a gente. Entramos em um mercadinho para comprarmos algo para o dia seguinte, a construção deve ser muito antiga, as paredes grossas, como de todas as construções por ali, o teto sustentado por largas vigas de madeira não aplainada.  Foi ali que compramos umas granolas e por sugestão do Magá, umas caixinhas de leite, pois daria para misturar o leite à granola, lembramos dos nossos copos Elf, que ganhamos em Salta. Ele comprou colherinhas plásticas e outras coisas.

Havia no lado oposto da praça um evento em um salão, havia música e nós entramos, é um salão grande com bancos e um palco, havia umas poucas pessoas lá dentro e na parede atrás do palco algumas vestimentas típicas da região, além de um senhor vestido "a caráter" que circulava pelo lugar com suas bombachas. Era uma exposição anual sobre o folclore local. Não ficamos muito por ali e sentamos às mesas que havia do lado de fora na rua, sempre acompanhados pelo Lobão.  Não me lembro mas acho que o cardápio não nos agradou, eu fiquei observando um argentino que chegou com uma XT660R azul, na moto uma pequena mala amarrada entre o banco e o bagageiro, ele estava equipado, inclusive com botas de offroad, fiquei imaginando ele passando por aqueles areiões à noite, acho que ele deve conhecer bem o local para fazer isto. Ele ficou lá conversando com uma senhora enquanto nós voltamos calmamente em direção à pousada, acabamos jantando no restaurante anexo, onde havíamos almoçado, o Lobão foi junto.

O Magá e seus modelitos fashion
A noite chega e nós vamos bater lata por Cachi
rua do mercadinho
Anexo à igreja, acho que é um museu, mas estava fechado

Muita tranquilidade
A capela de Cachi
Eu tentei, mas sem tripé...


Arcos mouros?
Dentro do mercadinho, olhem as vigas do teto!

Hum! compramos umas coisinhas


Gaúcho argentino
O André e o lobão, na mostra anual de trajes típicos
Acho que no inverno por ali, dá até pra sentar em cima de um destes

Tá todo mundo muito chique aqui, menos nós
O lobão companheiro
Cara!  me esqueci  de lavar a única cueca que eu trouxe na viagem!
Este é macho, ou doido...  ruta 40 à noite de moto!
Hora do jantar
Jantamos tranquilamente e fomos dormir, no dia seguinte iríamos passar literalmente pelo ponto alto da viagem, Abra El Acai, a quase 5000 m de altitude. 

Porém na hora de dormir um frio daqueles, ventava gelado!

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